terça-feira, 24 de janeiro de 2017

A pessoa é imagem de Deus

Mutthu ori nihuwa na Muluku
A pessoa é a muda/imagem de Deus.

Vamwerini enowa khenahiya malepa,
nto nihuwa naya.
Cada mês a cobra não deixa as manchas,
mas a sua muda.

Introdução

Durante a guerra civil viajava-se sobretudo de noite para evitar encontros com os da Renamo. Sendo assim, à noite procurava-se viajar em coluna e de preferência ao luar para percorrer um caminho branco/visível (ephiro yottela) e assim evitar pisar cobras. Dormia-se também no mato sem fogo para não atraiçoar a nossa presença. Ao amanhecer uma vez aconteceu que um dos acompanhadores assustou-se bastante, pois descobriu que eu tinha dormido perto de uma muda de cobra. Mas logo me tranquilizou dizendo: “Não é a cobra mas só a sua antiga pele, a cobra mesmo não há-de estar longe, mas mesmo assim depois da muda anda doentia e não agride. Além disso, padre, deve saber que esta é a muda da cobra, mas nós também somos muda, sim a muda de Deus: mutthu nihuwa na Muluku”.
A dupla explicação era mais que suficiente não só para me tranquilizar mas também para despertar ainda mais a minha curiosidade acerca da cobra e sobretudo acerca do fenómeno da muda e a sua aplicação no horizonte teológico e antropológico. Foi tarefa dos pesquisadores satisfazer a minha curiosidade e na verdade comunicaram noções importantes que sinteticamente apresento.


1- Premissas morfológicas e etimológicas

Para entender o tema em estudo é preciso antepor uma análise etimológica. Nihuwa é um substantivo da segunda classe, a classe dos colectivos em geral. Etimologicamente nihuwa deriva do verbo ohuwa que significa criar crianças ou animais, fazer criação de animais, domesticar, educar/formar/cultivar pessoa, transformar, crescer.
Na forma reflexiva wihuwa o verbo assume sentidos mais específicos: criar-se, mudar-se, educar-se, formar-se, transformar-se, metamorfear-se, mudar ou largar a pele (cobras, pessoas...) e por fim despir-se.
Deste dois verbos derivam os seguintes substantivos que sempre têm latente ou patentemente um duplo sentido: por um lado um sentido teleológico de novidade, de rejuvenecer, de educação, de formação, de transformação, de crescimento em vista de uma nova vida, novo status; por outro um sentido entrópico de resto, de sobejo, de sobra de algo que envelheceu, que já desenvolveu a sua função mas que tem sempre o marco arqueológico de identidade, de memória, de fotografia autêntica.

1- Nihuwa, Ma-:
a- é a muda de cobra, queda, desfólio, camisa antiga da cobra: o aspecto arqueológico como o teleológico são patentes: trata-se de uma renovação/crescimento de nova pele, de um rejuvenecimento da cobra;
b- é o grão de amendoim que fica na terra de um ano para o outro e que é o primeiro a germinar/nascer/crescer e a ser colhido (ekolwele): patente é o sentido teleológico de renovação e continuação da vida, muito latente fica o sentido arqueológico, sobretudo entrópico.

2- Nihuwo, Ma-: frango, galo ou galinha já crescidos mas ainda jovens: também neste termo vale o que se disse acerca de nihuwa (b): patente é o sentido teleológico de renovação e continuação da vida, muito latente fica o sentido arqueológico, sobretudo entrópico.

3- Muhuwo, Mi-, Muhuwelo, Mi-: cria, criação: também para estes termos patente em modo quase exclusivo é o sentido teleológico de formação e transformação da vida, muito latente fica o sentido arqueológico, sobretudo entrópico.

4- namahuwa, A-: criador de animais, educador de pessoas, pessoa que transforma o dado arqueológico num dado teleológico renovado, maduro.

5- Namwihuwa, A-: auto-criador, auto-transformador que renovando-se deixa sobra, resto, muda, fotografia de si mesmo


2- Nihuwa na enowa
A muda da cobra

Com nihuwa em geral a biosofia e biosfera xirima entende a muda, a camisa, a pele antiga que a cobra deixa, umas delas anualmente, outras em zonas tropicais e subtropicais como a do Niassa mensalmente. Este pormenor foi confirmado por todos os pesquisadores e por outras pessoas por mim questionadas, porque achava errado afirmar o ritmo mensal da muda. Consultando também manuais ad hoc, confirma-se que em zonas quentes como as tropicais, existem cobras que mudam a pele várias vezes no ano.
Agora o camponês xirima insiste que se trata de um ritmo mensal em sintonia com as fases lunares. Com a lua minguante inicia o desfolamento da cobra, no interlúnio a cobra está num estado doentio, não se mexe nem agride, por fim com o novilúnio recupera todas as suas forças.
É evidente a analogia com a mulher, a cobra é um arquétipo feminino. Significativamente um pesquisador mencionou Gen 3, onde se fala da cobra que inicia a sua tentação com a mulher, devido a afinidade e homogeneidade biológica.
Além da ciclicidade mensal da muda, os textos salientam outro aspecto: por um lado é memória retrospectiva, é fotografia autêntica, é o resto arqueológico da cobra, por outro patenteia uma metamorfose nova, uma renovação de vida e de forças da mesma cobra.

Mweri wayevaka/wamalaka,
enowa enavoreiwa, enimìhuwa
mpaka orula nihuwa /nihuwalelo naya nothene,
vakhani vakhani mahiku eviraka
mweri munyowani okhumaka enolama
elipihaka exapala aya enyowani,
Com a lua minguante, a cobra adoece,
pois inicia o processo de desfólio da pele
até tirar toda a sua pele antiga/muda,
depois, devagar, com o passar dos dias,
com o novilúnio cura tornando-se forte com a nova pele.

Vamwerini enowa khenahiya malepa,
nto ennavoreiwa ehiyaka nihuwa naya,
ekhalelo ya enowa enlikana ni yela ya muthiyana,
ntoko niwalahu mbiblyani enowa ni Eva.
Cada mês a cobra não deixa as manchas,
mas adoece deixando a sua muda.
O seu comportamento é semelhante ao da mulher,
como se lê na Biblia: a serpente e Eva (Gen.3).

Nihuwa wanteya wa exapala ya khalai ya enowa,
nnahima otxentxeya/wummuwa wa erutthu aya,
niwoko enalatta/enatthara erutthu aya.
A muda é esfolar-se da pele antiga da cobra,
significa a mudança/renovação do seu corpo,
pois é semelhante a ele.

Mutthu òná nihuwa na enowa
onnatthawa èraka ti enowene.
Ao ver uma muda de cobra,
a gente foge exclamando que é a própria cobra.

Nihuwa na enowa nnalikana ni mwanene ìhuwale,
khaninkhala ehuhu yintxipale.
A muda é semelhante ao dono que se transformou,
não dura muito tempo/não tem consistência.

Enowa vamwerini enimwihuwa
ehiyaka vathi nihuwa naya nri nolikana ni enene.
Cada mês a cobra desfola-se/renova-se/rejuvenece
deixando no chão a sua muda semelhante a ela mesma.

Enowa yìhuwá khenètta ottai,
onavoreiwa nari khenluma.
A cobra quando se desfola, não anda longe,
está doente nem morde.

Wihuwa otokotoko ti oyara okumi onyowani,
ophwanya ephiro enyowani.
O desfólio maior é gerar nova vida,
é encontrar um novo caminho.

Enowa yìhuwa khentthikela owani wa khalai.
A cobra quando se desfola,
não volta para a toca antiga.


2- Nihuwa ni mMutthu
A muda e a Pessoa

Já só a nível biológico, a cobra resultou numa metáfora antropológica da mulher devido à ciclicidade mensal das mudas. Provavelmente esta afinidade levou a biosofia e biosfera xirima a assumir a metáfora nihuwa como paradigma aplicável a todo o plenisfério antropológico e ao horizonte teológico.
Em primeiro lugar, nihuwa patenteia uma das três componentes do mutthu, a sua sombra (eruku), a parte intermédia entre o corpo e o espírito, a parte ponte que junta as duas margens, sendo imagem e fotografia autêntica mas velada de ambas: não há sombra sem corpo nem há sombra sem espírito, em suma, nihuwa é o negativo fotográfico do corpo e do espírito ao mesmo tempo.
Por esta razão, a nihuwa antropológicamnte tem ciclos e fases próprias, onde o mutthu deixa parte do passado e se dispõe a dar saltos qualitativos de renovação e de rejuvenecimento como acontece nas iniciações, nos ritos terapêuticos, nas adversidades e calamidades da metereologia humana até à última fase, à última transformação que é a morte, entendida sempre como desfolio mas também como vida nova e definitiva do mutthu no útero materno de Deus Namuli.

2.1 Nihuwa na mutthu - A muda do mutthu

Nihuwa emp’aya ti erutthu,
nihuwa nnalikana ni eruku,
nnalikana ni ekhaikhai ya munepa enene.
A casa da muda é o corpo,
a muda é semelhante à sombra,
igual à imagem original do espírito mesmo.

Eruku nihuwa na mutthu,
mutthu òná eruku awe asuweleke
wera kònale munepa aka.
A sombra é a muda/imagem da pessoa:
se alguém vir a sua sombra,
deve saber que viu o seu espírito.

Makholo anèra: nihuwa nnakhuma vekhaikhaini.
Os antepassados dizem:
a muda/sombra vem da verdade,
(é imagem/fotografia da verdade).

Mwana ayariwaka onnarapa mahi,
onahima ovinxa nihuwa noyaraniwa.
A criança quando nasce toma banho
significa tirar-lhe a muda do nascimento.


2.2 Wihuwa, ohuwa wa mutthu
Metamorfoses do Mutthu

Mutthu watta mota mihuwelo awe.
A pessoa passa por muitas mudas/transformações.

Wihuwa womalihera wa mutthu ti okhwa wawe
ohalaka murutthu nihuwa nawe.
O transformar-se último da pessoa é a sua morte,
ficando o cadáver como a muda/resto/sobra/sobejo dele.

Wihuwa wa erutthu annahala makhuva/murutthu.
Na transformação do corpo ficam os ossos/cadáver.

Wihuwa ovinxa enamwane
ntoko ovoreiwa ni olama,
ntoko okhwa ni ovinyerera.
Transformar-se é tirar a criancice/infância,
é adoecer e sarar, é morrer e ressuscitar.

Wihuwa wiyara,
oyara okhala itthaya sinkhwa
okona ohusera okhwa,
okhwa okona womalela,
Transformar-se é gerar-se,
gerar é ser terras mortais,
dormir é aprender a morrer,
morrer é dormir plenamente.

Mukalampa wa omwene wihuwa,
omwene nipatxi onohiyeraniwa,
A sucessão do rei é criar-se/rejuvenecer-se,
é como o casaco que se deixa para outros.

Wihuwa olikana/olatta.
Auto-transformar-se é igualar-se/imitar-se.

Wàhuwa anamwane wihuwa/wipittikula.
Criar as crianças é elas transformarem-se,
/criarem-se/mudarem-se.

Makholo yèra: an’ihu yamuyará mwana,
hiyo tho nòhìhuwa vamosá ni yawo
Os antepassados diziam:
se os nossos filhos gerarem filhos,
nós também nos criamos, crescemos junto com eles.

Wineliwa wihuwa wa mutthu.
niwoko owineliwa onnahiya sa khalai.
A iniciação é a renovação da pessoa,
porque o iniciando deixa o passado.

Wihuwa orapa/omira murette.
Transformar-se/renovar-se é tomar banho/remédio.

Mutthu wihuwa wawe watta mota:
ovoreiwa, okhwa:
nto okhwa nnimwettahuno
wihuwa waya okumi tho.
A transformação da pessoa tem muitas formas
como adoecer e morrer,
mas a morte com a qual andamos,
a sua transformação é reviver.

Wihuwa ekhove ya Muluku Namuli,
wihuwa emoni /epheyo ya Muluku.
A muda é a cara/fotografia/memória de Deus Namuli,
é a saudação, o vento (eco) de Deus.

Vathi mutthu ori eruku/nihuwa
na yeyo onrowaiye okhala o Namuli munepene.
Na terra a pessoa é a sombra/muda daquilo
que será no Namuli como espírito completo.



3- Nihuwa ni Muluku
A muda e Deus

Em segundo lugar, a nihuwa antropológica é reflexo não só da estrutura intrínseca trinária do mutthu, mas é também reflexo transcendental de Deus. O mutthu é memória, imagem, gravura da imagem que Deus lhe doou e lhe deixou ao momento de o gerar.
Os textos produzidos pelos pesquisadores são numerosos e mesmo nas repetições demonstram desenvolver um tema bem conhecido, bem entendido e bem vivido a partir do berço autêntico da própria biosofia e biosfera cultural. Podem até despertar a duvida de serem paráfrases do texto bíblico do Gen 2, mas a metáfora nihuwa, catalizador e denominador comum de tantos textos, não remete a nenhum passo bíblico.
A riqueza, a vivacidade dos textos atraiçoa pelo contrário a presença de um caudal autêntico e genuíno da antropologia e teologia xirima. Raramente os pesquisadores demonstraram tantas formulações e variantes do mesmo tema. A teologia e religiosidade xirima não precisa do texto bíblico veterotestamentário e neotestamentário para proclamar e professar que o mutthu é muda/imagem de Deus, que leva em sí a marca que Deus lhe imprimiu no dia que o fez sair do seu útero materno. Se esta marca é especial e superlativa no horizonte antropológico, não falta em nenhum ser do reino animal, vegetal e anorgânico. A muda /imagem de Deus namúlico, cobra matriarcal, está bem imprimida e visível em todo o horizonte cósmico.

Muluku Namuli pwiyamwene
ti enowa enìhuwa
kahiyene vayakhani nari vamwerini vothene
mene ohiyu ori wothene,
nilepaka ni tho nehelaka nihuwa nawe
mwa itthu sothene ompattuxaiye.
Deus, Namuli matriarca, é a cobra que se desfola
não todos os anos nem todos os meses,
mas todas as noites,
escrevendo e imprimindo a sua muda/imagem
em todas as coisas que gera.

Muluku enowa etokwene yo Namuli
àhiya ekwanihero awe vanihuwani vawe,
eyo tiyo, mwa sopattuxiwa sothene,
nto vantxipalexa mwa mutthu ampattunxaiye.
Deus, a grande cobra do Namuli,
deixou a sua plenitude na sua muda/imagem,
isto é, em todas as criaturas,
mas particularmente no mutthu que gerou.

Nihuwa na Muluku ti eruku ni munep’awe wene.
A muda/imagem de Deus é mesmo
a sua sombra e o seu espírito.

Nihuwa na Muluku murim’awe wene,
khannithowa woniwa ni oromoliwa.
A muda de Deus é mesmo o seu coração,
não falta ser vista e mencionada/invocada.

Muluku onnakuxa nihuwa/eruku awe
onèttano vothevene mmatatani.
Deus leva a muda/sombra dele
andando em toda a parte com ela tendo-a nas mãos.

Muluku àhela vamutthuni nihuwa nawe,
sothene sinèreya vathi vava
sirino nihuwa na Muluku Namuli.
Deus pôs a sua muda/imagem na pessoa,
tudo o que acontece aqui na terra
tem a gravadura de Deus namúlico.

Mutthu nihuwa na Muluku
niwoko mutthu okhumale
mwa Muluku yowene pwiyamwene
ayarenle sopattuxiwa sothene mwa ekhove awe
alepaka’mo ekhove awe, ahiyaka’mo nihuwa nawe.
A pessoa é a muda/imagem de Deus
porque saiu de Deus mesmo,
matriarca que gerou tudo e todos
imprimindo a sua imagem e deixando a sua muda.

Mutthu ori nihuwa na Muluku
ahiyalaiye vathi vava vamosá ni hiyo,
Muluku mwanene akhaleke wirimu.
A pessoa é a muda/imagem de Deus
que deixou aqui na terra connosco
enquanto ele mora no Céu.

Mutthu nihuwa na Muluku,
niwoko vopatxera amupankaka mutthu
awehale erutthu awe.
A pessoa é a muda/fotografia de Deus,
porque no começo quando fez a pessoa,
ele olhou ao seu corpo/essência/identidade.

Òviye nihuwa na Muluku,
omòviye Muluku mwanene.
Quem tem medo da muda/imagem de Deus,
tem temor mesmo perante dele.

Onatthukaiye Muluku,
nihuwa nawe nnatthuka yeyo.
O que Deus amarra,
também a sua muda/imagem amarra.

Otthekeru, khonawerya otxipiha
nihuwa na Muluku mmurimani mwá.
Mesmo pecando, tu não apagas
a muda/imagem de Deus no teu coração.

Mutthu onaramusa ettini,
onnanariha nihuwa na Muluku àkhenlaiye.
A pessoa que despreza a religião,
estraga a muda/imagem de Deus que recebeu.

Wakhwá, Muluku onnìtthana nihuwa nawe,
anyi, mokhwani Muluku onnakuxa nihuwa nawe,
okhalaka vathi vava murutthuru á pahi..
Na tua morte, Deus chama a sua muda/imagem,
sim, no caso de morte Deus leva a sua muda/imagem,
ficando aqui na terra só o teu cadáver.

Khonèriwa: kamònale Muluku,
oriki wònalene nihuwa nawe.
Não se diz: se eu visse a Deus,
se já viste a sua muda/imagem.

Nihuwa na enowa khannirera niwoko noluma.
nihuwa na Muluku khannòpiha nari khannòpopiha.
A muda da cobra nunca é agradável, porque morde,
enquanto a muda/gravura de Deus
nunca é perigosa nem ameaça.

Mwettelo w’axirima othene àsuwela
wera mutthu ori nihuwa na Muluku.
Todos os xirima conforme a sua cultura sabem
que a pessoa é a muda/imagem de Deus.

Mutthu nihuwa na Muluku
okhala wera onlikana ni yowene,
ti muluku a vathi, muluku mukhani,
ti ekwanihero etokotoko ya Muluku,
omuluku onakhala vamutthuni.
A pessoa é a muda/imagem de Deus.
porque é parecido com ele mesmo,
é o deus da terra, o deus pequeno,
o maior complemento de Deus,
a divindade encontra-se na humanidade.

Nihuwa na Muluku ninnawerya opanka itthu sotikiniha,
Muluku àpattuxa itthu
wera nihuwa nawe nnilamuleke
ni nnimwaleke vothevene.
Mutthu ti mutokwene a sopattuxiwa sothene,
t’ovahale masina wa sothene,
mowiwana ni nihuwa sàkhenlaya.
A muda/imagem de Deus
consegue fazer coisas maravilhosas.
Deus as criou para que a sua muda/imagem
mandasse e resplandecesse em toda a parte.
O ser humano é a maior de todas as criaturas,
deu nomes a todas elas
em conformidade à muda/imagem que receberam.

Mutthu nihuwa na Muluku,
niwoko mutthu t’onlikana ni yowo,
ti elataretto ni ekwanihero awe etokotoko
wopwaha sopattuxiwa sawe sothene sikina:
mutthu ti mutokwene a valapo.
okhalano ikuru sintxipale.
t’onùpuwela vantxipale.
O mutthu é a muda/imagem de Deus,
porque é semelhante a ele,
é a sua fotografia e seu complemento maior
mais que todas as outras suas criaturas:
o mutthu é o cabeçário do mundo,
dispõe de muitas forças e de muitos ideias.

Mutthu nihuwa nokwanihera na Muluku
niwoko ori muthiyana ni mulopwana,
àhiyeraka siso nwiya nawe nene.
O mutthu é a muda/imagem completa de Deus
porque é mulher e homem,
deixando-lhes assim o seu mesmo respiro.

Wihuwa wa Muluku opattuxiwa wa mwana.
Muluku mwaná:
khavo oyariwe ahikhalano nihuwa na Muluku.
O mudar-se de Deus é o nascimento da criança.
Deus é criança:
ninguém nasceu sem a muda/imagem de Deus.

Muluku òkhalano ehuhu yothokorora nihuwa,
kula mutthu òkhalano eyakha awe yowakhelela.
Deus aguarda a altura para a sua muda,
cada pessoa tem o seu ano para a receber.

Nèttelá sa Muluku nihuwa nawe opisa othama.
Ehuhu yaphiyerá, Muluku onnakuxa
nihuwa nawe nnotthikela
mmurupani/muniphwanyani mwawe mo Namuli.
Seguindo as normas de Deus,
a sua muda/imagem demora a sair de nós,
na altura própria Deus leva-a,
a sua muda/imagem regressa
ao seu bolso/útero no Namuli.

Ekhove ya Muluku nihuwa nawe mmutthuni,
tivanto mutthu onamulapelaiye/onanvekelaiye Muluku.
A cara de Deus é a muda dele na pessoa.
por isso essa o adora e o invoca.

Nihuwa na Muluku ari malaya awe,
vowariha mutthu onnatxentxa ekum’awe
akuxaka ekumi enyowani.
A muda de Deus é a camisa dele,
ao vestí-la o mutthu muda a sua vida,
pegando num caminho novo.

Mutthu nihuwa na Muluku
niwoko mutthu nikhurumela ni exapala ya Muluku,
wona wi Muluku t’onvahale ephattuwelo awe,
niwoko Muluku onnètta n’atthu.
niwoko mutthu ori ethoni ni munepa awe.
niwoko Muluku onòneya vamutthuni,
niwoko Muluku muthato wa mutthu.
niwoko miteko sa Muluku t’onvara mutthu,
niwoko ikano sa Muluku sinimwèttiha mutthu,
niwoko Muluku t’omusuwenle mutthu,
niwoko mutthu t’onìwa masu a Muluku,
niwoko khavo ohinamwasa Muluku,
niwoko Muluku khanimuhiya mutthu ahawaka,
niwoko Muluku onaremera ni mutthu,
niwoko mutthu onùluma ni Muluku vamapuro mothene,
niwoko movelavelani khavo onamuramusa Muluku.
niwoko mutthu onnapuha wa Muluku.
niwoko Muluku ti murette ni murettele wa mutthu
O mutthu é a muda/imagem de Deus,
porque ele é a nódoa e a pele de Deus,
porque é Deus que lhe deu a existência,
porque Deus anda com o mutthu,
porque o mutthu é a cara e o espírito dele,
porque Deus é visível no mutthu,
porque Deus é a ponte do mutthu,
porque as obras de Deus são as do mutthu também,
porque as normas de Deus guiam o mutthu,
porque Deus conhece bem o mutthu,
porque o mutthu escuta a palavra de Deus,
porque não há ninguém que não procure a Deus,
porque Deus não deixa o mutthu no sofrimento,
porque Deus é rico com o mutthu,
porque o mutthu fala com Deus em toda a parte,
porque na necessidade ninguém despreza a Deus,
porque o mutthu goza em Deus,
porque Deus é remédio e paz do mutthu.

Mwan’aka, omàle kòlele
wera mutthu nihuwa na Muluku mwanene elapo.
okhala nihuwa na Muluku mutthu ori vokhwani.
Meu filho, cala-te, vou te informar
que a pessoa é a muda/imagem de Deus,
para ser tal a pessoa é destinada a morrer.

Sinanisuweliha wera mutthu ori nihuwa na Muluku
siri minepa sèraka:
mutthu ti nihuwa na Muluku kwekwe.
Os que nos informam
que a pessoa é a muda/imagem de Deus
são os espíritos que afirmam:
a pessoa é a muda de Deus para sempre.

Muluku namahuwa/marukunuxa/mukakhari.
Deus é criador, virador, raíz.

Omuhuwa mutthu omuhuwa Muluku.
Criar/educar a pessoa é criar/dilatar Deus.

Muluku Namuli nikhumalahu’wo,
Muluku t’opatxenre wihuwa.
vowayara atthu mwa nihuwa nawe,
oyariwa olatta.
Deus é Namuli donde saímos,
Deus é que começou a transformar-se,
gerando todos conforme a sua muda/imagem:
nascer é imitar/copiar.

Wihuwa wetta ni atthu,
niwoko Muluku opatxenre okhala
va sopattuxiwa sawe sothene ni vamutthuni,
Ephattuwelo khenakhummwa.
Muluku khapá: empawe eri vamutthuni:
Transformar-se é andar com as pessoas,
porque Deus é que começou a viver
com todas as suas criaturas e com as pessoas,
da origem não se sai:
Deus é como o cágado:
a sua demora é a humanidade.

Khole khonamuyara tthupili,
nto Muluku t’onamuyara mutthu
mwa nihuwa nawe.
O macaco não gera macaquinho/chico,
pelo contrário Deus gera a pessoa
conforme a sua muda/imagem.


4- Nihuwa ni Ekristu
A muda e a Fé cristã

A iridescência simbólica e metafórica da muda da cobra não se esgota nem se apaga entrando no horizonte do Kerigma cristão. Como imagem autêntica deixada pela cobra, o paradigma nihuwa consegue focar bem e exemplificar o centro da fé cristã que é a encarnação de Deus no seu Filho Jesus, cara e imagem primária de Deus na história da salvação. Nihuwa é uma apropriada metáfora cristológica, Jesus é imagem única de Deus, desfigurada na cruz por imolação, perenizada na Eucaristia.
Além de ser um paradigma cristológico, a metáfora nihuwa torna-se também paradigma que estimula a fé viva e simples do cristão xirima na SS. Trindade. Ele não recua de tentar de patentear simbolicamente a vida interna trinitária à luz da metáfora em estudo. Deus é uno e único, mas na dinâmica de três mudas/reflexos/caras recíprocas.
Por fim o tema em estudo recebe a sua aplicação também no sector eclesial e sacramental.


Nihuwa ni Yesu/Oraru Wottelaxa
Muda e Jesus /SS. Trindade

Mwekristuni nihuwa na Muluku
ti Yesu vantxipalexa, mopoli àtthu othene.
No cristianismo a muda/imagem de Deus
é sobretudo Jesus, o salvador de todos.

Muluku òmuyara Mwan’awe Yesu Kristu.
Yesu orino nihuwa nawe nokwanihera.
Deus gerou Jesus Cristo, seu Filho.
Jesus possui toda a muda/imagem de Deus.

Nihuwa nopatxera na Muluku ti Yesu kristu,
Ti yowo onisuwelihale
wera hiyo nri nihuwa na Muluku Atithi
A primeira muda/imagem de Deus é Jesus Cristo.,
é ele que nos fez conhecer
que somos muda/imagem de Deus Pai.

Yesu àhìhuwa vamuttandani
niwoko na sottheka sahu.
Jesus desfigurou-se na cruz
por causa dos nossos pecados.

Makholo anèra: nihuwa ti olatta wa Muluku.
Yesu Kristu ti nihuwa wa Muluku,
amulantte Muluku Atith’awe anene,
mirirya sawe sothene ti mirirya sa Muluku.
Os antepassados afirmam:
a muda é imitação/semelhança de Deus:
Jesus Cristo é a muda/imagem de Deus,
imitou a Deus mesmo, seu Pai,
todos os seus milagres são os milagres de Deus.

Yesu Kristu àhiya nihuwa nawe mokaristiyani.
Jesus Cristo deixou na Eucaristia
a sua muda/imagem/memória.

Mwana ni Munepa Wottela
nri nihuwa nnakwanihera Oraru Wottela.
O Filho e o Espírito Santo
são a muda/imagem/reflexo pleno de Deus Pai.

Atithi, Mwana ni Munepa Wottela,
Muluku ori mmosaru, mahuwa awe araru
O Pai, o Filho e o Espírito Santo
é Deus uno mas em três mudas/imagens/reflexos.

Mwekristuni Munepa Wottela
nihuwa na Muluku Atithi ni Yesu Kristu.
Conforme a fé cristã o Espírito Santo
é a muda/imagem de Deus Pai e de Jesus Cristo.

Nihuwa na Munepa Wottela
nnakhala vamurimani wa mutthu.
A muda/imagem do Espírito Santo
vive no coração do baptizado.

Mwa makholo awe mutthu nihuwa na Muluku,
vano mwekristuni nòleliwa wi
Muluku t’okwanihera onitaphulela
miruku seiya sothene sa makholo ahu
vanirumihalaiye hiyo Yesu Kristu, Mwan’awe,
nihuwa nawe nomalela nokwanela ni nokwanihera
vamosá ni savaha sothene sa Munepa Wottela.
Para os nossos antepassados
a pessoa é muda/imagem de Deus.
Agora na fé cristã fomos informados
que Deus acabou de nos explicar todo o sentido
desta afirmação dos nossos antepassados,
enviando-nos o seu Filho, Jesus Cristo,
sua muda/imagem plena, definitiva e ultimante,
junto com todos os dons do Espírito Santo.


Nihuwa ni Ekereja/Ekristu
Nihuwa e a Igreja/Ética cristã

Watta w’akristu wihuwa wa ekereja.
A multidão dos cristãos é a cria da igreja.

Erutthu empa ya nihuwa na Muluku,
Ekereja empa ya nihuwa na Yesu
vothevene ni va maithoni va miloko sothene.
O corpo é a casa da muda/imagem de Deus.
A igreja é a casa da muda/imagem de Jesus Cristo
em toda a parte e perante todos os povos.

Mutthu ori nihuwa na Muluku
namwi yottheka ya Adamu ni Eva, makholo awe.
A pessoa é a muda/imagem de Deus,
apesar do pecado de Adão e Eva, seus antepassados.

Mutthu òttiya maru,
onnatthara nihuwa na satana.
A pessoa renitente segue a muda/imagem de Satanás

Akristu othene arino mmurimani mwaya
nihuwa na Muluku mmosaru ni Oraru wottexa
yakhenlaya nihiku na obatizo aya.
Todos os cristãos têm no seu coração
a muda/imagem de Deus uno e trino
que receberam no dia do baptismo.

Obatisiwa wihuwa wa ekereja,
orimwihuwa mwa Yesu Kristu,
ti okhwa ni ovinyerera mwa Yesu Kristu,
ti oyariwa wanaveli, ti wineliwa ekristu
orukunuxa murima ni otthare ephiro ni ekum enyowani.
Ser baptizado é ser criado pela igreja,
é recriar-se em Jesus Cristo,
é morrer e renascer nele,
é renascer pela segunda vez,
é ser iniciado na fé cristã,
é converter-se e seguir novo rumo de vida.

Wihuwa ohiya sa khalai sa satana
ni otthara sa nanano sa Evanjelyu.
Transformar-se é deixar o passado mau de Satanás
e seguir o presente bom do Evangelho..

Ohinàttittimiha atithi ni amay’awe,
onnìva nihuwa naya yavahiwaya ni Muluku.
Quem não respeitar os pais,
mata a muda/imagem de Deus que receberam.

Hiyo niweherenre wihuwa womalela
nihiku nomalihera nokhwa wahu.
Nós esperamos a transformação definitiva
no último dia da nossa morte.

Alavilavi annatxipiha nihuwa na Muluku.
Os maus ofuscam a imagem de Deus

Oyara wona ni wonihera nihuwa nawe Muluku.
Gerar é ver e fazer ver a muda/imagem de Deus.


Apreciação crítica

Todos os axiomas em estudo assustam pela riqueza recôndita que guardam. Também no caso da muda da cobra o olhar do vidente xirima soube descobrir e formular oralmente assuntos e problemas que atormentam desde sempre a procura e a reflexão filosófica e teológica. Quem é o mutthu? Que definição exaustiva encontrar?
Como de costume, o xirima, o ser humano da “primeira palavra”, da percepção imediata das coordenadas da vida, não indugia em encontrar imagens, paradigmas, metáforas que não esgotam o tema mas também não o eludem, pois animam a ir mais em profundo, mais além. Alérgico por natureza às abstracções, contemplando o fenómeno da muda da cobra, a biosofia e biosfera xirima demonstra dutilidade e esperteza em empregar tal fenómeno às polaridades básicas como Muluku-Mutthu e Mutthu-Muluku. O ser humano é a imagem, a gravação, o negativo fotográfico de Deus. O mutthu é o tipo, Muluku é o protótipo. Com extrema simplicidade oral e beleza narrativa o xirima encerra e sintetiza montanhas de livros de inquietação humana.
Como os pesquisadores são cristãos, pode surgir a dúvida que as suas formulações são reduplicados do Gen 1-3. Mas observou-se durante a analise do axioma que nenhum passo bíblico acena minimamente à muda da cobra. Além disso e ainda mais, se o texto bíblico fala que Deus criou o ser humano à sua imagem e semelhança, não se preocupa minimamente em explicitar, exemplificar e aclimatizar tal afirmação no mundo imagínico, simbólico e metafórico dos adressados como pelo contrário a biosofia e biosfera o faz com desenvoltura, até com abundantia cordis.






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